Abordagem para o ensino da matemática de forma participativa, colaborativa e lúdica para estimular o aprendizado, auto-estima e gosto pela matemática. Projeto apoiado pelo Instituto TIM.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Pergunta sem resposta.


Há algumas semanas passadas, estava na escola dando aula para meus alunos. Quando o intervalo tocou, dispensei os alunos e comecei a arrumar minhas coisas, para sair e lanchar. Quando fui surpreendida por um grupo pequeno de alunos, uns três.  Abordaram-me quando todos saíram da sala e perguntaram: Tia você pode dar aula pra gente no recreio?
Eles são alunos do integral, alunos que precisam de uma atenção maior então passam o dia todo no colégio tendo aula de reforço, fazendo atividades extras e brincando. Alguns alunos do integral tem aula do circulo de matemática com o Elisson, só que em outro dia da semana. Então imaginei que esses não faziam parte do circulo. Eles já haviam lanchado e estavam livres e como eu não estava com fome, topei. 

Falei: Ok! Podem entrar que eu dou uma atividade legal pra vocês.

Então um deles olhou pra fora e gritou: A tia topou, vai dar aula pra gente!

E logo vieram mais três, fiquei com seis alunos na sala. Perguntei o que eles queriam aprender, pois imaginei que estavam me procurado por estarem com duvidas em alguma matéria especifica. Eles responderam que nada em especial, só queriam ter uma aula. Comecei a pensar que eles sabiam do circulo por meio de outros alunos e estavam curiosos, então perguntei se sabiam da atividade pirâmide do faraó. Alguns responderam que não e outros que sim. Comecei a dar aula e logo fui perguntando o que eles sabiam da historia do faraó e assim foi. Antes de começarem a falar um deles comentou que o Faraó era “levado” igual dois alunos aqui da sala e começou uma discussão básica que interrompi, até que um deles riu e me confessou: Tia na verdade a gente “tá aqui” porque essa semana fomos expulsos de sala de aula do circulo da matemática. A gente bagunça muito ai o Tio Elisson tirou a gente de sala e eu não queria ficar sem a aula do circulo essa semana então tivemos a ideia de pedir pra você dar a aula, já que é boazinha (com um sorriso no rosto).

Olhei pra eles e falei sobre a importância de se comprar em sala, que o aprendizado era influenciado por isso e outros sermões básicos. Falei que continuaria a dar aula, mas que isso não se repetisse, pois era falta de respeito com o professor. Continuei a aula e prosseguimos com a história do faraó, logo um deles comentou que ele era um rei que escravizava as pessoas e os demais me perguntaram se era verdade. Comentei que sim e que inclusive foi dessa forma que construíram as pirâmides. Então um dos alunos levantou a mão e me questionou: Mas tia, porque as pessoas escravizam as outras pessoas? “Tipo” nós negros que já fomos escravos, porque as pessoas faziam isso com a gente?

Olhei em volta e três dos meus seis alunos eram negros, os outros possuíam traços de descendência negra. Todos me olhavam com atenção e um pouco de frustração pela questão ali levantada. E eu, ali no meio, como filha de um negro não tinha resposta. Na hora uma tristeza me abateu e eu mesma me questionei: Mas porque as pessoas fazem isso? Durante o meu curso na Universidade além de algumas matérias extras, peguei uma que se chama: Pensamento Negro contemporâneo. Conta a historia dos negros, sua trajetórias e lutas. Naquele momento poderia discutir qualquer fato histórico com eles sobre os negros, menos o porquê as pessoas fazem isso.  

Eu devolvi a pergunta e comentei que assim eram com as mulheres os judeus e todos que já foram de alguma forma perseguidos ou oprimidos no mundo. Eles comentaram que acham que é porque havia fraqueza neles e assim discutimos mais um pouco e pedi que levassem essa questão pra casa, pra discutirem com os pais e um dia chegaríamos a uma conclusão. Não queria manipular ninguém com minha opinião e os deixei livres para pensar. E depois voltei pra casa com todo meu conhecimento e um coração angustiado, me perguntando, o porquê as pessoas fazem isso?

Esse era mais um daqueles momentos em que a Ellen me disse uma vez: Às vezes nós somos mais que professores desses alunos, têm momentos em que você precisa ser o pai, mãe, o irmão, o conselheiro e até a única referência de adulto que eles têm. E pensei hoje.. Essa é mágica que poucas profissões nos oferecem e ser professor nos permite com maestria e trabalho, experimentar esses momentos únicos e difíceis. Momentos de perguntas sem respostas, mais que isso, momentos em que instigamos uma das atitudes mais lindas do ser humano, o pensar.


PS: Feliz dias dos professores! \o/

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